Está tudo bem no Turismo regional? O Governo garante que sim, apesar de acenar com os desafios permanentes que o destino Madeira enfrenta. Os empresários têm comportamento misto. Uns denotam satisfação porque de facto têm uma operação consolidada, pouco dependente de modas e amuos. Outros queixam-se porque estão nas mãos dos operadores. Alguns são frontais e para além de não esconderem desconfiança em relação ao empolamento e manipulação dos números, assumem sem medos que o sector já viveu melhores dias
O alerta mais recente, dado pelo director geral do Reid’s, que em entrevista ao DIÁRIO assumiu um 2019 abaixo das expectativas, com quebras nos principais mercados emissores, nomeadamente no inglês, alemão e suíço, “situação bastante preocupante, reflectida de forma visível no primeiro trimestre do ano e que infelizmente continua a verificar-se nos próximos meses”, a par das estatísticas de Abril, motivam uma abordagem no segundo ‘Raio X’, deste feita elaborado pela Técnica de Turismo, Filipa Fernandes.
O Turismo representa para a Madeira cerca de 25% do Produto Interno Bruto e emprega cerca de 20 mil pessoas.
No presente, a Madeira enfrenta um grave problema, o número desproporcional de camas em relação à procura pelo destino.
Em 2016, a Região tinha cerca de 6 mil camas em alojamento local (AL) e outras 30.700 em empreendimentos turísticos. Volvidos 3 anos, o Alojamento Local contabiliza perto de 15 mil camas e estima-se um valor superior às 31 mil para os empreendimentos turísticos.
Esta “abundância” de oferta não foi acompanhada pela procura do destino. Ou há falha na promoção sustentada nos mercados emissores de turismo ou falta bom senso nos licenciamentos.
Em abril de 2018, os números dos relatórios enviados ao sector pela Associação de Promoção apresentavam uma quebra na taxa de ocupação na ordem dos 4,4%. O valor ao mês da taxa de ocupação em 2018 era de 70,7%. Este ano, de acordo com os valores apresentados pela DREM, a taxa de ocupação ao mês é de 59,9%, logo a quebra é de 10,8%, comparativamente aos dados recebidos em 2018 da Associação de Promoção. Por outro lado, e se os valores acumulados até abril de 2019 forem de 65,3%, como informou a DREM, não se registam quebras mas sim um ligeiro aumento na taxa de ocupação na ordem de 1,2%, por comparação com o ano anterior, de acordo com os dados enviados pela AP que se suspeita, sejam manipulados. Consultados vários agentes do sector, há unanimidade, a quebra na taxa de ocupação é igual ou superior aos valores apontados (10,8%).
Desde janeiro 2018 – devido ao Brexit e também à recuperação de destinos como a Turquia, Marrocos, Tunísia, Egito (países que investem milhões para recuperar a sua quota de mercado) – a entrada de turistas alemães e ingleses está em quebra na Madeira. Do mercado inglês, de acordo com os dados enviados ao sector, a quebra acumulada, em abril de 2019, é de 6,5%. Da Alemanha, é de 7,3%. Há outro fator que influenciará, de forma negativa, a performance do mercado alemão, o bom tempo que se faz sentir na Europa, que fará acentuar ainda mais a quebra deste mercado no Verão de 2019.
Se com a falência da Germania a Região perdeu cerca de 20 mil lugares, as notícias oriundas do mercado Inglês não são animadoras. A Thomas Cook deixou de voar para a Madeira e a Região perde já, no Verão 2019, só com esta companhia, 52 voos, comparativamente ao ano anterior. Para a estação de Inverno, estima-se uma perda de 15 mil lugares da companhia Jet2.
Não será fácil à Região recuperar lugares de avião, há uma grande procura pelos destinos emergentes como a Turquia que cresceu 80% no mercado inglês e mais de 40% no mercado alemão ou a Grécia que cresceu 35%. Chipre é outro destino concorrente que procura no mercado alemão a compensação das perdas sentidas no mercado inglês. Espanha sente também quebras do mercado alemão, mas apesar dos números não terem sido ainda divulgados pelos grandes operadores, estimam-se que sejam muito elevados.
De outros mercados para a Madeira, há ainda a apontar um decréscimo do mercado francês na ordem dos 6,6%, e do mercado nacional, na ordem dos 3,6%. No Verão de 2019, verifica-se um aumento de voos da Polónia.
No combate a esta situação na Madeira, há pacotes de ofertas especiais com reduções de preços nos nossos hotéis, destinados a vários mercados que, infelizmente, não produzem o efeito desejado.
Seria da Região apostar nos destinos de proximidade, como o mercado nacional, mas, devido ao subsídio de mobilidade arquitetado e vigente, tal não é possível, os valores das passagens aéreas estão demasiado elevados, provocados pela procura para compensar os voos diretos que tínhamos com a Alemanha (Germania) ou outros destinos, como França, que ocupam alguns ou a maioria dos lugares de avião disponíveis. No momento atual, os operadores têm grandes dificuldades em vender pacotes, e tal facto sentiu-se em março e abril, com a falta de lugares de avião para a Região, situação que se repete no Verão. Os preços estão elevadíssimos na rota Lisboa-Funchal. É preciso referir que, por exemplo, a TAP, companhia com 50% de participação pública, não voa de nenhum destino europeu diretamente para a Região, “entope” Lisboa e concorre com os passageiros regionais. Face a tudo isto, é urgente a revisão do modelo de subsídio à mobilidade, não só para os madeirenses e porto-santenses, mas para que não se prejudique ainda mais o Turismo, sector vital para a Madeira.
Apontados que estão os fatores exógenos que explicam as quebras, existem também fatores endógenos que contribuem de forma muito negativa para os resultados que se verificam e que são: o Governo Regional tem responsabilidades no número de camas que licenciou para o alojamento local e para empreendimentos turísticos: tem responsabilidades no modelo arquitetado para o subsídio à mobilidade dos madeirenses. Um teto máximo de 400 euros fez com que os preços das passagens aéreas, nomeadamente com a TAP, aumentassem exponencialmente o seu valor. Nos fatores endógenos, são graves os constrangimentos que se verificam no nosso Aeroporto, que contribuem de forma muito negativa para a imagem do destino e que provocou já o abandono de duas companhias aéreas. Não há plano efetivo de contingência no terreno, as companhias observam e não arriscam. Infelizmente, os dois últimos fatores apontados arrastam-se há demasiado tempo e de forma irresponsável por parte dos Governos Regional e da República, com claros prejuízos para a Região, para a sustentabilidade do destino e dos investimentos realizados por empresários do setor.
É claro para todos os que trabalham no Turismo na Madeira que este entrou em contraciclo, não por falta de Planos ou Estratégia, mas sim por falta da aplicação destes por parte do Governo Regional. Estou convencida de que assim que o Governo Regional analisar o peso que o sector do Turismo tem para a nossa economia, em detrimento de uma política que aposta no betão, a promoção do destino não se cingirá a 1% do Orçamento e a resolução dos graves problemas não se arrastarão no tempo.